continuando...
Pergunta da Catharina: "Pascalzinho, você também foi na inauguração do campanário da igreja do Carmo?
Participou das marteladas nos sinos(faça-me soar por R$50,00)? Você assistia no sábado à noite filmes seriados no Colégio Dom Silvério?"
Não quero despertar inveja não, mas eu era PAGO para
tocar o carrilhão! O "pagamento" consistia em um um
sanduiche de mortadela e uma garrafinha de Guarapan.
Mas isso foi muito depois do tempo daquela foto... Nesse
novo tempo eu odiava o saudoso e querido Mário de Lima
(a melhor gargalhada da família) porque ele era quem
levava Mãe Lili à Missa do Carmo às cinco da tarde
de
todos os domingos. E aí eu me infiltrei no coro, tocando
órgão e também o teclado do carrilhão, matando
de
inveja o Mário, muito melhor pianista, organista e
tecladista do que eu. O teclado do carrilhão era de
execução difícil, pois o som vinha muito tempo depois
do
toque na tecla, não havia eletrônica avançada, o
sistema era eletro-mecânico.
O cinema de Sábado no Dom Silvério era fantástico,
mas
não exibia apenas seriados. Após o seriado vinha um
longa-metragem, geralmente de aventura, do tipo "O
Gavião e a Flexa", "Lafitte o Corsário", todos velhíssimos
já naquele tempo. O ingresso custava uma merreca, era
mais barato do que o "piruá" que se comprava no portão,
e que eu preferia à pipoca porque 1: era mais barato. 2:
era muito mais barato. 3: era quase de graça. 4: os que
a gente não consguia triturar com os dentes podiam ser
cuspidos na cabeça daqueles que se sentavam à nossa
frente no escurinho do cinema. Eu "trançava" o tempo
todo, variando da minha "tchurma" cuspideira de piruà
não-triturável à vizinhança relativa à
Raquel, a você e
àquela babá preta, bravíssima, que as acompanhava,
já
taludas. A Raquel, aliás, depois de Vivian Leigh em "O
Vento Levou", foi a última garota a andar acompanhada
de babá até os vinte e um anos de idade! A babá me
odiava e dizia à Dona Maria Luiza a meu respeito: "Êss'aí
é muleque safado qui nem uzôtro tudo! Ss'acara de
santin é só prumod'ingambelá ocêis. Cumigo não,
violão!"
Eu acho que o Abdala teve de levar a babá com eles na
lua de mel...
Voltando aos seriados, só consigo lembrar-me de um,
propaganda americana anti-nazista da II Guerra, em que
um grupo de alemães infiltrados não sei onde tentava
fazer não sei o quê contra os mocinhos que não sei
bem
quem eram. O problema é que o chefe dos mocinhos era
na verdade o chefe dos nazistas. Os capítulos
geralmente terminavam com uma luta dentro de uns
aviões estranhíssimos, de onde sempre caía alguém
sem
para-quedas.
NÃO PERCAM O PRÓXIMO CAPÍTULO!!! CONSEGUIRÁ
BOB
ESCAPAR DA QUEDA DE 20 000 LÉGUAS SUBMARINAS?
(Epa! esse é outro, debaixo d'água!) DE 20 000 METROS
DE ALTURA?
Nem só de cuspir piruá vivia a minha gangue: também
acendíamos pavios de "barbantinho alemão", o popular
"peidão", que desprendia emanações sulfídricas
desgraçadamente fedorentas, ou então, às vezes,
soltávamos bombinhas que, infelizmente, faziam o Irmão
Roberto Borges, gerente, operador e segurança do
cinema, suspender a sessão. Era muito estranho queimar
peidão sábado à noite e comungar domingo de manhã
na
mesma capela-auditório, usando calça azul-marinho e
blusão branco sem gola debruado de azul com escudo
mariano do lado esquerdo do peito com o monograma
das letras VJMJ sobrepostas: Viva Jesus, Maria e José.
Entrávamos, os alunos assim uniformizados, pelo
corredor central em plano inclinado descendente da
capela, "desembestados", diante da perplexidade da
assembléia de cristão ali reunidos para o Santo Sacrifício
da Missa das oito, sentávamo-nos arfantes nos primeiros
bancos do lado direito, junto ao harmônio tocado por um
Irmão gordinho de óculos, e entoávamos em uníssono
Estudantes Maristas cantai,
neste dia de glória e de amor,,
em que a Igreja celebra de um pai
as virtudes em magno esplendor...
As virtudes em magno esplendooooor!
Champagnat nos mostrou de Maria
que o exemplo da vida imitar (gostaram da inversão da
frase?)
é o caminho seguro da glória
que no Céu se recebe sem par...
Se recebe sem paaaaar!
Mas eu gostava mesmo era de
Levantai-vos, soldados de Cristo!
Sus! Correi!
Sus! Voai!
À vitória!
Desfraldando a bandeira de glória,
o pendão de Jesus redentor!
Eu saía dali com vontade de, cristãmente, trucidar com
piedosa crueldade todos os incréus, dos sarracenos
seguidores de Mafoma aos Romanos que lapidavam,
queimavam e lançavam às feras os nossos primeiros
mártires.
Mas eu já era velho nesse tempo, tinha em torno de
doze anos, dois anos mais tarde me apareceu a primeira
mecha de cabelos brancos no topete. Isso fazia sucesso
nas horas-dançantes das irmãs Grandinetti, na Serra,
mas já é outra história...